02/12/2007

ELEGIA

 

Geraldo Reis


Mas eu que sempre te segui os passos

Sei que cruz infernal prendeu-te os braços

E o teu suspiro como foi profundo. 

        (Cruz e Sousa, Últimos Sonetos, p. 18.)


Como quem pôde dormir na tua intimidade, e se acostumando

contigo não calcula, nem de longe, a falta que fazes

 

Como quem não teve paz porque te quis um dia

para querer-te depois o tempo todo e toda eternidade

 

Como quem se esgota sangrando e esconde

repetidos sobressaltos diante de teu porte

 

Como quem se disfarça na tua presença e rumina

a verde esperança, como dizem, de um dia pernoitar-te

 

Como quem não se revela aos deuses novos ainda vivos

nem aos deuses antigos que escaparam mortos

 

e esconde de ti, de si mesmo, de estranhos e dos íntimos,

essa dor que não cessa e que se multiplica

 

Como quem se dilacera com o natural comedimento de teu riso

e abomina o teu gesto de amor em direção a outrem

 

Como quem se inflama repleto de desejo

na vontade mil vezes reprimida de abraçar-te

 

e se mostra indiferente como se não te desejasse

e não se ferisse todo por dentro, e não sangrasse, e até

 

não se morresse diante dos que te possuíram toda

- e por inteiro, -  e te possuindo logo te olvidaram

 

Como quem reza para que acabe a festa,

levando os teus pares para o mundo das trevas

 

Como quem tenta ao piano acordes inéditos para despertar-te

agora que fazes a viagem-não, a infeliz viagem, indesejável e imprevista,

 

Como quem perde o entendimento de tudo, o entendimento

das coisas simples como o desabrochar dos dias, tão natural,

 

Dos gestos interrompidos, e das rosas que ontem colhias

e que hoje foram ao teu sepultamento,

r e p o u s o.

 

Repouso e tento crer na vida eterna

para na vida eterna encontrar-te

 

E ao encontrar-te, perder-me

nos inacessíveis abismos que não entregas à terra

 

E que haverão de salvar-me da colheita irreversível,

preservando-me do tempo e de toda enfermidade

 

e do pântano

e das trevas

e do efêmero.


Geraldo Reis – BH 29.10.2002

3 comentários:

  1. oi titioooooooooooo!!
    adorei o blog!
    ddesculpe a demora da visita, mas ando um pouco antarantada com meus afazeres da faculdade, sabe como é? haha!
    e só agora pude ver o seu convite em minha página de recados!
    aqui estou, e digo mais, estarei por aqui sempre! frequentadora assídua da cultura e da expressão de criatividade criados por titio! beijos!
    flávia camelo

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  2. Flavinha, estou comovido!!!! Creia.
    Dibulgue o blog, estou em campanha. E como ninguém conhece o bloguinho do Tio Reds, estou contanto com "chegados". Apareça, e a casa estará em festa com a sua presença.

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  3. Flávia: Estou vendo que escrevi "contanto" quando deveria escrever "contando". De qualquer forma, no contexto, o termo ainda permite compreensão. Ainda bem. Essa "ELEGIA" é um poema que fiz com muita vontade. Sabe quando você não desiste do poema que veio maisou menos incompleto, e que precisa de ser levado, até porque é, sempre, um poema que insiste em não acabar? Pois essa ELEGIA é isso. Beijo do Tio Reds.

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