13/10/2018

A TÚNICA


A TÚNICA: QUASE  POEMA DE NATAL

 
Geraldo Reis


Branca, a túnica é indivisível.

É multiplicada e é multiplicadora.

Todos a recebem por inteiro

no dia do próprio nascimento

ao aviso de que devem mantê-la acesa

para que o Menino,

rompendo o ventre das Trevas

reine por inteiro o tempo todo.


Mas, um dia...

(sempre tem “um dia”)

alguém se descuida,


e a Luz

ficando longe

paliúmida

           se apaga

trancando-se depois

como o sol

no enferrujado baú de um dia findo.


Com seus elmos arrefecidos à sombra

de uma oliveira já vencida de cansaço

a milícia romana se refaz em festa

e alguns soldados procuram desmatar

o mito:


Há que dividir-se

(por que não?)

a túnica indivisível.


Ao redor do fogo frio

e da geometria de um deus em desatino

a reboque de um menino extenuado

ouve-se próximo

o grito desnatalizado das hienas

que levará dos homens todos

o derradeiro Natal.


A despeito, porém, das hienas

e dos soldados e dos gritos

e dos ásperos caminhos arrepanhados de luz

há de renascer o Menino eficiente

por inteiro

com a sua túnica indivisível

em desfavor da flor enriquecida de urânio

e em favor de uma única pétala de paz.

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