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AI DE TI, HAITI!
Márcio Almeida
Ai de ti, Haiti!
Cloaca da miséria a perguntar ao mundo
se Deus existe.
Entulho da morte, pátria do caos.
Ai de ti, carniça viva
a dar azia em urubu.
Nação a mando do diabo,
do açúcar acre, do carvão sem cinza,
do exército cômico para deleite de Guerrit Verschuur,
da vida a menos de um dólar,
da única universidade soterrada no desconhecimento
de sua fragilidade sísmica.
Ai de ti, cemitério a céu aberto
como seus esgotos, suas heresias no Palácio dos Milagres,
suas feridas abertas na História,
suas dinastias que Papa e Baby DOCumentam o horror da desgraça
que não cessa,
seu jugo estrangeiro a quem em inglês, francês, espanhol ou vudu
exauriu seu solo, furtou seu pouco de nada, anulou seu futuro.
O inferno pó-moderno teve seu apocalipse trêmulo
e chama-se Haiti.
Subserviência sob domínio da fome,
Terra morta por terremoto,
entre saques e violência,
povo sem sinapse com o real,
em fuga sem para onde,
aeroporto sem destino,
Porto Príncipe sob a realeza de mundo-cão.
Que os seus mortos adubem a esperança,
que seus políticos de mentira aprendam com a finitude,
que suas ajudas humanitárias
reconstruam o que seu povo nunca teve,
que suas ruínas ensinem a ouvir
entre vozes de concreto o apelo
de barrigudinhos catarrentos,
que seu cheiro pútrido chegue aos salões de festa,
às mesas fartas, aos bunkers dos G8,
aos cultos e aos discursos dos poderosos.
Ai de ti, Haiti!
Agora que a Natureza te riscou do mapa
e abalou o alicerce do planeta,
e que o mundo, solidário ao seu castigo por existir
escravo de tudo e todos,
possa, Haiti, vingar como veneno tardio
a única certeza de Deus não morrer antes
de um dia te ver feliz.
POESIA NA ESTANTE
- 50 POEMAS (Antologia bilíngue: Português e Alemão) - Anderson Braga Horta / Tradução de Curt Meyr-Clason)
- A CONTINGÊNCIA DO SER - Célio César Paduani
- A INSÔNIA DOS GRILOS - Jorge Tufic
- A RETÓRICA DO SILÊNCIO - Gilberto Mendonça Teles
- A ROSA DO POVO - Carlos Drummond de Andrade
- A SOLEIRA E O SÉCULO - Iacyr Anderson Freitas
- A VACA E O HIPOGRIFO - Mário Quintana
- AINDA O SOL - Gabriel Bicalho
- ARTE DE ARMAR - Gilberto Mendonça Teles
- ARTEFATOS DE AREIA - Francisco Carvalho
- AS IMPUREZAS DO BRANCO - Carlos Drummond de Andrade
- BARCA DOS SENTIDOS - Francisco Carvalho
- BARULHOS - Ferreira Gullar
- BAÚ DE ESPANTO - Mário Quintana
- BICHO PAPEL - Régis Bonvicino
- CADERNO H - Mário Quintana
- CANTATA - Yeda Prates Bernis
- CANTIGA DE ADORMECER TAMANDUÁ E ACORDAR UNS HOMENS - Pascoal Motta
- CANTO E PALAVRA - Affonso Romano de Sant'Anna
- CARAVELA - REDESCOBRIMENTOS - Gabriel Bicalho
- CENTRAL POÉTICA - Lêdo Ivo
- CONVERSA CLARA - Domingos Pelegrini Jr.
- CORPO PORTÁTIL - Fernando Fiorese
- CRIME NA FLORA - Ferreira Gullar
- CRISTAL DO TEMPO & A COR DO INVISíVEL - Maria do Rosário Teles do invisível
- DIÁRIO DO MUDO - Paulinho Assunção
- DICIONÁRIO MÍNIMO - Fernando Fábio Fiorese Furtado
- DUAS ÁGUAS - João Cabral de Melo Neto
- ELEGIA DO PAÍS DAS GERAIS - Dantas Motta
- ESTESIA (Triolés) - Napoleão Valadares
- FANTASIA - Napoleão Valadares
- FINIS TERRA - Lêdo Ivo
- GUARDANAPOS PINTADOS COM VINHO - Jorge Tufic
- HORA ABERTA - Gilberto Mendonça Teles
- HORTA (Versos em Três Tempos) - Anderso de Araújo Horta - Maria Braga Horta e Anderson Braga Horta
- INVENÇÃO DE ORFEU - Jorge de Lima
- LAVRÁRIO - Márcio Almeida
- LIRISMO RURAL (O Sereno do Cerrado) - Gilberto Mendonça Teles
- MEL PERVERSO - Márcio Almeida
- MELHORES POEMAS - Paulo Leminski
- NARCISO - Marcus Accioly
- O ESTRANHO CANTO DO PÁSSARO - Célio César Paduani
- O ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA - Cecília Meirelles
- O SONO PROVISÓRIO - Antônio Barreto
- O TERRA A TERRA DA LINGUAGEM - Gilberto Mendonça Teles
- OS MELHORES POEMAS DE FERREIRA GULLAR - Ferreira Gullar
- PASTO DE PEDRA - Bueno de Rivera
- PLURAL DE NUVENS - Gilberto Mendonça Teles
- POEMA SUJO - Ferreira Gullar
- POEMAS REUNIDOS - Gilberto Mendonça Teles
- POEMAS REUNIDOS - João Cabral de Melo Neto
- POESIA REUNIDA - Jorge Tufic
- RETRATO DE MÃE - Jorge Tufic
- SIGNO (Antologia Metapoética) - Anderson Braga Horta
- VER DE BOI - Pascoal Motta
- VESÂNIA - Márcio Almeida
- VIANDANTE - Yeda Prates Bernis
Um comentário:
MÁRCIO ALMEIDA continua ótimo. Mandou-me esse poema que é dolorosamente real. Aqui, Márcio Almeida repete, homem de seu tempo, um registro histórico, como fez quando escreveu esta maravilha: "ao homem vietnã / possível de um matiz / eu cubro o corpo de lã / e o pensamento de giz". O autor de LAVRÁRIO, em permanente evolução, escreve uma poesia em geral difícil (com o mistério da poesia em evidência através de arrojado processo de criação). Nesse poema, mais direto, conquista imediatamente um público maior, um público que reclama sua presença nos livros didáticos; sim, porque Márcio Almeida é, seguramente e há muito tempo, um clássico. (Geraldo Reis)
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